sexta-feira, 1 de fevereiro de 2008

Todas as Cartas - Para a lua em nome da noite.


Pintura de Almeida Júnior



De minha paisagem de dentro te escrevo,


Saudações!

Delírios verbais.

Queria sair de mim para melhor me explicar. Mas infelizmente eu não sei me abandonar. Esse gosto de manhã em minha boca me perturba a noite, perturba a noite de mim. Não sei ser manhã. Eu não sei me abandonar. Em tudo sinto o avesso do verso que é minha alma. Um beijo insípido tenta meu vinho. Uma embriaguez qualquer alucina meu deus. Eu não sei me abandonar. Sei ser sozinho, mas não me abandonar. Quereria, mas não sei.

Ímpeto e serenidade.

Olhos e olhares e mãos e eu.

O choro se mistura a solidão de mim. Escrevo.
Quero saber qual o teu cheiro para a noite. Quero saber de tua tristeza e de tua alegria. Qual o teu medo? Quero te saber.
Você uma mulher vestida de tarde. De um entardecer contemplativo. Uma mulher vestida de crepúsculo. Mas com vazios existenciais tremendos. Deliciosamente triste, furiosamente delicada.

Maquiei meus fantasmas com batons, rímel e solidões. Com o cheiro de minha infância. Todas as minhas ausências são palpáveis. Um ser repleto de sendas, silêncio de cicatriz na pele. Chamam-me de poeta, mas não passo de uma sensação. De um olhar ainda por vir, de uma melancolia alegremente triste. Sensação.
Qual tua paisagem de agora? Que nudez veste teus delineamentos?
Eu não profiro nada, as palavras falam, as palavras falam-me todas as noites. Palavras são almas em delírios.
Não desejo ser subversivo com tua delicadeza. Mas não desejo falar de mim sem deixar que meus silêncios gritem, sem despir-me até do que é nudez. Com isso, confesso que choro lágrimas absurdas em madrugadas inteiras e febris, que recito em madrugadas outras, poemas extraídos do cerne de minha dor e existência. Toda minha vida foi e é tolerável pela poesia e loucura que em mim coexistem. Tenho sensações que desperta meu íntimo e põem para dormir meu medo. Acredito que já provasses da ousadia que experimentamos em nossos sonhos. Confesso que tirei dos mesmos as tentações e suas respectivas ousadias, e com elas procurei colori a realidade.

Aderi ao pecado por encontrar nele uma forma de vida mais intensa, mais humana, poética e prazerosa. Minhas preces são compostas pela essência dos meus pecados. Pelos sussurros das mulheres que tive e pela nudez ainda promessa.
Poupo-te da crueza de meus relatos mais insípidos. Quero apenas te mostrar a suavidade e o sangrar de cada angústia que me habita, de cada paixão que me consome e perturba. Por favor, uma dose de amor outro, para esse poeta que possui o hábito do pecado. Que cerra as pálpebras em devoção a tua fineza e recolhe mancinho a palavra, deixando que apenas o silêncio gesticule. Sinto ímpetos arrebatadores diante de tão enorme alma e de teus olhos meninos. Olhos a procura, olhos que parecem sozinhos quando na verdade multidão são. Diria que tuas pálpebras são outonais. Há um desfolhar poético e suave na estação dos teus olhos. Teus olhos falam, os meus são rascunho.

Meus delírios são lírios que ornamentam a loucura que tenho.
São meu vinho.

Por favor, uma palavra para o silêncio de mim.
E eu entenderia o meu pecado.

5 comentários:

Anônimo disse...

inquietação singular do que é se sentir intensamente, próprio de tudo que concebe-se nessa condição (extraordinariamente vital) e que embora não encontre descanso, possui o privilégio de gozar os êxtases que contém os "pecados".

Admiro essa sua intimidade com a flores, os olhares, e especialmente com o silêncio carregado de palavras.

Um abraço.

Di espatódea

Anônimo disse...

Essa é carta mais linda que já li.

Anônimo disse...

"Essa é carta mais linda que já li."
Diego


Eu:
Foi a carta mais bem guardada!

Anônimo disse...

Poeta, isso não é uma carta somente. É todas as noites e todas as luas. Um poema digno de um grande escritor.

Unknown disse...

Fico sem palavras cada vez que te leio...